Hoje,
depois de um dia agitado, de uma semana agitada, dentro de uma vida corrida,
sentei-me e decidi que era hora de conversarmos. Então, convido você a sentar,
ouvir, pensar. E, depois repensar, repensar e quem sabe, perceber, como eu, que
existe algo a ser mudado. Que a hora é agora, que não há mais jeito de fingir
que perdeu o bonde, que não é com você, que não é bem assim. Eu te convido a
uma conversa simples e prática. Não começa comigo e nem termina comigo. É sobre
todas nós. Hoje, a partir de tantas e tantas leituras, de livros e da vida, eu
quero sentar, escrever... Eu quero falar sobre mim e sobre o feminismo.
Acho
justo explicar o motivo desta conversa. Há mais ou menos 15 dias, escrevi sobre
o livro “Para educar crianças feministas” da Chimamanda Ngozi Adichie. Por
aqui, e por outras plataformas, surgiram algumas falas que, de muitas maneiras,
me assustaram. Pouco tempo após a postagem, o feminismo, movimento histórico que
muito lutou para eu pudesse me expressar em diferentes esferas, foi chamado de
“lixo”, “escória”; dito “nocivo à sociedade”. Nocivo. Nocivo a uma sociedade em que a cada
11 minutos uma mulher sofre violência simplesmente por ser mulher.
Então,
se você, depois de muitos livros aqui apresentados, de muitas questões que,
juntas, pensamos, não acha possível “concordar com o feminismo”, mesmo sendo
mulher, eu me apresento. Falo das minhas questões, do que significou, e
continua (re)significando, o feminismo na minha trajetória. Falo como quem fala
de esperança. Porque, para mim, o feminismo que me constitui é um pouco disso:
a crença, a esperança, o desejo incontrolável de ser tanto e tudo que desejo. A
luta para continuar tendo esperança de ser tanto e tudo. A esperança de estar
viva, após uma caminhada escura na volta para casa, e poder continuar lutando.
Eu
sou Mariane. Já faz um tempo que vocês me leem e conhecem, de muitas maneiras,
minha forma de enxergar o mundo. O que veio antes? Eu cresci ouvindo que uma
mulher nasce para casar, ter filhos, constituir família. Pode até estudar, pode
até trabalhar. Porém, o sentido básico de sua vida é o sacerdócio do lar. Eu
fui criada para almejar o casamento, para mudar de identidade quando mudasse de
nome. Não nasci para me pertencer. Sempre fui de outros.
De
outros.
Os
outros, no machismo, é parte importante da equação. O machismo não existe sem a
dura comparação entre nós mulheres. E, principalmente, entre nós e eles. Por
muito tempo ouvi que ele, meu irmão, era o mais inteligente, mesmo quando eu
tirava as notas mais altas ou era mais criativa na resolução de problemas
cotidianos. Para mim, restava a beleza e o esforço. E eu aceitei. Aceitei que
eu não era boa e que tinha que me esforçar mais, comparar-me mais, ser mais
parecida com outros. Nunca mais parecida comigo. Porque eu era menina. Meninas
fazem assim...
E
a culpa seria de quem? Dos meus pais? Da minha mãe? Ela também aprendeu desse
jeito. Porque todas nós aprendemos. A questão é... Até quando vamos aceitar que
seja assim? Até quando vamos aceitar que não tem jeito, que estamos fadadas a
ser o que querem que sejamos?
Outro
dia, dei uma rápida entrevista a um jornal sobre a situação da minha
Universidade. Entre muitos comentários, um chamou a atenção. Um homem conhecido
soube de tal entrevista. Ele, surpreso, prontamente disse: Você deu uma
entrevista para o jornal? Você? E não o seu irmão? Sim, eu. Porém, a minha voz
parece ser escutada como um eco. Não é raro que, em conversas com parentes e
conhecidos, eu e um homem tenhamos a mesma opinião e apenas ele seja escutado.
O mundo, independente do que um homem fale, escuta sua voz. Nós ainda
precisamos gritar. No entanto, quando gritamos, somos chamadas de loucas,
histéricas.
Nossas
vozes nunca são ouvidas. Nossas reivindicações só servem quando servem a
outros. Outro dia, ao falar com um homem que ele estava tomando decisões sem
consultar as pessoas que por ela seriam afetadas, ele disse, autoritário: não
vou falar com você, não vou te dar explicação. Saiu andando, como se ali não
houvesse alguém. Eu, atordoada, respondi àquele homem que eu era gente. Ele
teria sim que me escutar. Tive que reafirmar a minha condição de humana, de
gente, de pessoa capaz de compreender, argumentar. Com quantos homens, mesmo
que em discordância, isso aconteceria? Quantas vezes você não foi escutada numa
situação em que qualquer homem seria ouvido? Quantas vezes algo aconteceu com
você que, se invertido o gênero, isso nunca ocorreria? Ou, pelo menos, não
ocorreria cotidianamente, com tanta naturalidade?
Não.
Não deveria ser assim. E é por isso que o feminismo existe. Ele não é o
contrário de machismo. Feminismo é a luta, permeada por tanta diversidade
quanto há mulheres no mundo, que tem permitido que passemos entre frestas, a
caminho da sonhada liberdade, enquanto nos libertamos aos poucos do que nos
agarra e silencia. O feminismo não é uma entidade suprema, imutável. O
feminismo somos nós, unidas, pensando juntas, sendo solidárias, justas, acreditando
no poder de escolha uma das outras. Sendo abrigo, casa, ombro, degrau de outras
mulheres. É um convite a nossa resistência. É pela vida de cada uma de nós
sendo respeitada. É a simples ideia de que somos gente. Gente, inclusive, que
pensa diferente, que tem demandas diversas, mas que ouve, debate, cresce e se
fortalece. Mulheres de movimento, em movimento. Umas pelas outras.
E
eu? Permita-me dizer: Sou Mariane. Ainda sou cristã e ainda quero me casar. O
que mudou? Sei que não é o casamento ou a maternidade que dará sentido à minha
existência. Minha existência já tem sentido: sou gente. Eu ainda me considero
uma pessoa esforçada. Porém, tenho consciência da minha inteligência, da minha
capacidade de resolver problemas e argumentar. Sou tudo isso. Sou feminista.
Lutando, todos os dias, para não menosprezar outras mulheres, não julgar suas
escolhas, não as estereotipar. Lutando para que os espaços públicos e privados
me pertençam, tanto quanto pertencem aos homens. Acreditando que eu sou, porque
muitas lutaram antes de mim para que eu pudesse ser.
Eu.
Você. Todas juntas. Passando pelas frestas, lutando por nossa liberdade.
"Eu. Você. Todas juntas. Passando pelas frestas, lutando por nossa liberdade."
ResponderExcluirEu ainda me assusto com essa luta que parece não ter fim, em pleno século que estamos vivendo. Como pode ainda ter tantas mentes trancadas, diminuindo a mulher e a colocando sempre no mesmo lugar?
Posso não entender muito do assunto, mas sei que lugar de mulher é onde ela quer estar!!!
Adorei!
Beijo
Oiie! Como já disse algumas vezes, não entendo mto do assunto, mas acho mto bacana livros q abordem o assunto, tenho curiosidade de conhecer um pouco, por isso vou anotar a dica!
ResponderExcluirBjs
Olá!!!
ResponderExcluirMuito bom o seu texto defendendo a todas nós e acho super legal isso, quem sabe o ser humano ainda aprenda algo de bom na vida eu prefiro e procuro aprender com os animais, opiniões cada um tem a sua e merece ser respeitado ninguém é obrigado a gostar de tal pessoa ou opiniões mas é obrigado a respeitar e vou continuar sempre com isso na cabeça.
Tenha um bom dia!!!
Oi, Mariane!!
ResponderExcluirAdorei a postagem!! Acho muito importante que existam livros ensinando que nós meninas somos importantes e podemos fazer o que quiser.
Bjoss
Mariane!
ResponderExcluirÉ isso mesmo, o feminismo passa por todos seus argumentos e devemos nos posicionar sempre, mesmo sem seremos chamadas, mesmo que achem que os homens devam falar no lugar de uma mulher, mesmo que tentem nos calar. A luta só será vencida se nos unirmos!!
Bom domingo e feriado!
“A sabedoria é a única riqueza que os tiranos não podem expropriar.” (Khalil Gibran)
cheirinhos
Rudy
Oi.
ResponderExcluirGostei muito do texto e de suas palavras.
Nesse mundo tão imenso, há espaço para todos, independentes de raça, cor, sexo ou qualquer outro determinante. Unidas, somos o melhor de nós mesmos.
Beijos!
Oi Mariane.
ResponderExcluirVocê escreveu divinamente bem.
Eu ainda sonho com uma sociedade dirigida pela igualdade, onde o papel da mulher não seja só casar, ser dona de casa e ter filhos, e apesar de nós mulheres já teremos ganhado muito lugar nessa batalha ainda vemos comentários e atitudes machistas diariamente, adorei os quotes que selecionou.
Bjs.
Olá Mariana, tudo bem?
ResponderExcluirExcelente texto, adorei tudo por aqui e concordo plenamente contigo. Na empresa onde eu trabalho tem uma grande concentração de empoderamento feminino e os homens dão atenção a nossa voz, até porque temos muitas lideres por lá, bem mais do que homens e isso por si só já é um grande caminho, mas diariamente, a gente vive passando por situações que irrita bastante e as vezes tem que bater de frente e dar som a nossa voz. Não precisamos e nem devemos sussurrar, se for necessário, devemos gritar... nos expressar, mostrar que somos gente que nem todos... e que nada nos diferencia de sermos seres humanos... independente do gênero. Adorei conversar contigo. Xero!!!
http://minhasescriturasdih.blogspot.com.br/